Segundo este vídeo, o brinquedo Senhor Cabeça de Batata foi lançado na
década de 60, mas não da forma que o conhecemos hoje: eram peças soltas na
caixa e a sugestão da empresa é que o boneco fosse montado em um legume
qualquer. O resultado era encantador, só que na versão assustadora. Permite
exercitar mais a criatividade, coisa e tal, mas confesso que a composição ‘peças
mal feitas’ + ‘legumes disformes’ ficava bem estranha. Como nasci “um pouco”
depois disso, já tive contato com o brinquedo desmontável todo feito de
plástico. Segundo minhas lembranças, era bem divertido arrancar os olhos
criar personagens diferentes a cada brincadeira.
Como sabíamos que, mesmo depois de muitos anos, a tal raiz não comestível
continuava a ser vendida, resolvemos dar uma para Luna de natal. Silvio
encontrou na Internet a maleta completa da versão masculina, com várias opções
de cada parte do corpo. Coincidência ou não, minha tia deu de presente a esposa
do distinto Senhor.
E num belo dia no começo deste ano, provavelmente num sábado chuvoso ou
algo do tipo, resolvi fazer uma associação que influenciaria cada dia de nossas
vidas até hoje. Enquanto brincávamos com as batatas de plásticos, lembrei que
tínhamos os DVDs do Toy Story, onde o Senhor Cabeça Desmontável faz parte do
grupo principal de personagens da história.
Fiquei tão animadinha! E fui logo chamando Luna pra assistir comigo a
animação da Pixar. E pra resumir a história, o que aconteceu foi que Luna gostou
tanto (tanto, tanto, tanto, tanto, tanto, tanto, tanto, tanto, tanto, tanto,
tanto, tanto, tanto, tanto, tanto) que, desde aquele dia ela pede pra ver
Woody, Buzz, Jessie e Cia TODOS OS DIAS! Não falha um! O que ameniza a coisa
toda é que a história é dividida em três partes, portanto conseguimos variar as
tramas. Depois de uns dias, Silvio, que não aguentava mais olhar pra televisão
e ver “as mesmas imagens”, começou a estimular que outros desenhos fossem
assistidos nos momentos de descanso da pequena. Mesma assim, o cowboy
continuava a ser preferência absoluta em casa. Já decorei falas e movimentos
das personagens e, de vez em quando, eu aproveito o momento pra tirar um
cochilo enquanto “assisto” ao desenho com a pequena.
Durante este tempo, e mesmo antes, vínhamos percebendo que a dentição da
Luna estava se projetando pra frente por conta do uso da chupeta e sei que este
pequeno objeto pode ter influência em relação às infecções de ouvido; como Luna
tem a adenoide aumentada, as infecções naturalmente tendem a ser mais
frequentes do que numa criança sem esta questão.
Há meses ela usava o bico só pra dormir, mas como às vezes acabava
passando a noite toda com o bendito na boca, no final de fevereiro comecei a
pensar na possibilidade de tirar de vez o objeto de nossas vidas. Sim, NOSSAS
vidas, pois quem chupa é a pequena, mas somos eu e Silvio que temos que guardar,
pegar, lavar, levar...
E vi na Páscoa a ocasião perfeita pra mandar a chupeta embora. Como
muitas mães já fizeram, também achei mais cômodo fazer chantagem
tranquilo usar uma ocasião especial e conseguir uma troca amigável entre
chupeta e um presente. A próxima data comemorativa seria apenas em outubro, então
resolvemos que o momento seria agora! E tudo se encaixou perfeitamente: controlo
bem a quantidade de doces que Luna consome, então eu já não daria ovo de páscoa
(até porque sei que ela ganharia de Deus e o mundo!) e como ela tinha se
tornado fã de carteirinha do cowboy e do patrulheiro espacial, combinamos que o
coelhinho traria de presente seus personagens preferidos e como agradecimento,
daríamos a chupeta em troca. E esse combinado foi relembrado com frequência desde
então. Cada vez que Luna pedia a chupeta, a gente conversava sobre como ela
estava crescendo e como ficava bonita com a boca sem nada pra atrapalhar seu
sorriso.
Um pouco antes do dia tão esperado, minha mãe lembrou que, ao tirar a
chupeta nesta época, faríamos Luna passar por duas “perdas” ao mesmo tempo, já
que ela está na fase do desfralde. Fez todo o sentido, mas ao conversar com
Sil, ele me lembrou há quanto tempo estávamos sustentando essa história do
coelho levar a chupeta e não fazia mesmo o menor sentido voltar atrás agora.
Na noite de sábado, tivemos uma última conversa. Num primeiro momento,
Luna colocou a chupeta na cesta que montamos para o coelho, ao lado da cenoura.
Na hora de dormir, porém, ela pediu a chupeta e nós damos mesmo assim, relembrando
que seria a última vez.
Minutos depois, tiramos a dita cuja de sua boca e já aproveitei para guardar
todas as chupetas da casa no armário. A noite foi um pouco agitada e
Luna acordou resmungando algumas vezes. Em tempos remotos eu andaria feito
zumbi até seu quarto, procuraria a chupeta e devolveria para sua dona se
deleitar e voltar a dormir. Mas dessa vez o sonífero foi na base da conversa e
do carinho. Um sono desesperador, meu, é claro!
A noite seguinte foi um pouco pior, a cria acordou mais vezes e acabei
ficando mais tempo com os olhos abertos do que gostaria, acalmando-a. Vim
trabalhar na segunda-feira exausta. Mas depois disso as coisas ficaram mais
tranquilas, Luna passou a dormir a noite toda e nas poucas vezes que pediu pela
chupeta, saiu uma voz meio falhada, como se, na metade da palavra, ela mesmo recordasse
do que tinha acontecido com o objeto, antes tão estimado. Assim que olhamos com
cara de espanto e lembramos a manhã de domingo, Luna esquece daquilo como se
não tivesse nem tocado no assunto. Vez ou outra ela insiste um pouco mais na
questão.
É um alívio não precisar mais se preocupar com a danada da chupeta,
simplesmente esquecemos que ela um dia existiu em casa. Como disse uma amiga do
trabalho, a chupeta serve pra acalmar os pequenos em momentos de estresse, mas é
basicamente um instrumento cômodo e facilitador das NOSSAS vidas e não da vida dos
filhos.
Quatro dias depois da despedida, assistimos ao DVD do espetáculo de final
de ano da escola. Luna estreava nos palcos sem ter completado dois anos. Por
motivos que desconheço (cansaço, sono, enfim), ela entrou pra dançar de
chupeta. Ao se ver no vídeo, com a boca coberta pelo plástico colorido, Luna
não hesitou: “Chupeta feia!”
Sucesso!