terça-feira, 11 de setembro de 2012

Vapor com amor

E tudo que é bom na vida, um dia acaba...
Acho que generalizei demais; mas vou falar de algo muito específico.
Quando um novo bebê nasce - dependendo das relações presentes na família – o recente casal ex-grávido recebe ajuda de todos os lados; mas, pra variar, são as matronas que estão mais presentes e se doam o quanto podem. Com a gente foi assim também. As avós da nossa cria, sempre que precisamos, se desdobraram em mil para nos socorrer.
Atualmente eu e Silvio nos revezamos para passar a roupa de casa; e qualquer pessoa que tenha um bebê na família sabe a montanha de peças de algodão, linho e afins que se acumula em poucos dias. Ou seja, nosso cesto está sempre cheio. Mas durante 18 meses sabíamos que ele se esvaziaria uma vez por semana, e as roupas estariam passadas em cima das nossas camas; infalivelmente. E sabem por quê? Porque Dona Otília Medeiros havia se comprometido a realizar tal função. Dominadora da arte do ferro a vapor, a chefe da família Medeiros tomava trem, metrô e lotação de Perus até a minha casa para garantir que os moradores de lá tivessem roupas limpas AND passadas toda semana.
Essa “promessa” começou com os dias contados. A avó paterna de Luna faria a romaria semanal até chegar a data de sua viagem – já marcada quando a pequena nasceu – para sua terra natal; Portugal. E sabe a máxima “Aproveita porque passa rápido”?! Pois bem, a última peça de roupa foi passada pelas mãos da minha sogra no meio de julho deste ano e dias depois ela estava num avião (a sogra, não a peça de roupa), atravessando o oceano.
Nas primeiras semanas Silvio estava trabalhando em casa e tinha mais tempo de cuidar dos afazeres domésticos, portanto fiquei afastada da função de passadeira por mais um tempo. Mas eu sabia que minha hora chegaria. E chegou.
E quando chegou eu descobri porque minha sogra fazia questão de vir toda semana em casa passar nossa roupa e, principalmente, passar a tonelada de bodies, meias, babadores, calças e afins da neta. Porque ela fazia com muito amor. Mesmo exercendo a tarefa com rapidez e perfeição, sei que ela estava cansada no final do dia, porque passava horas de pé, encostada na mesa da cozinha, movendo os braços de um lado pro outro. Mas ela não falhava nunca, fizesse chuva ou sol. E eu só percebi isso quando me coloquei literalmente no lugar dela.
E essa ficha não caiu logo na primeira leva de roupas. Há poucos dias, tarde da noite, enquanto eu dava conta de tirar os amassados da semana, Silvio sugeriu que eu deixasse tudo como estava, porque ele estaria de folga no dia seguinte e poderia dar conta do recado. Mas neste momento olhei para o vestidinho que estava passando e não quis deixá-lo ali, em cima da mesa, interminado. Mesmo exausta, eu queria passar a roupa da Luna, porque aquilo, de um jeito ou de outro, me ligava a ela; queria passar a roupa, porque o amor que eu sinto por ela estava traduzido ali, no vapor do ferro e no calor da roupa dobrada.
É claro que me dá preguiça, dói os braços, dói as costas e, neste exato momento, o cesto lá em casa está cheio, abarrotado; e eu aqui criando coragem pra estender o cobertor na mesa da cozinha, o lençol por cima, empilhar as peças num canto da mesa, encher o ferro com água e começar o trabalho. Mas quando a coragem chega e a pilha de roupas amassadas dá lugar á uma pilha de roupas em miniatura limpinhas, macias e quentinhas, aquece também o coração.
Este pode ser um post de agradecimento à Dona Otília pela dedicação que sempre teve conosco; mas é também de agradecimento por me ajudar a ver a vida – e o cesto de roupas - com outros olhos.