Ontem foi um desses dias. Quando Silvio
a pegou na escola, no final da tarde, ela tinha acabado de dormir e não acordou
nem quando chegou em casa, quando Silvio a tirou da cadeirinha do carro.
Sabemos que quando é assim, seu corpinho quer descansar até o dia seguinte.
De madrugada acordo com ela sentada na
cama dizendo “Peta? Peta? (chupeta)”. Meio múmia, meio zumbi, procurei a chupeta
na cama, devolvi à ela e fiquei olhando aqueles olhinhos que me pareceram muito
bem acordados. E aqui uma confissão sem culpa alguma: se o cansaço é muito, muito
tipo ontem, minha única reação é pegar a pequena e levá-la pra minha cama,
assim garanto que não precisarei mais levantar por qualquer motivo que seja. Como
cama de mãe tem sonífero, assim que deitou a cabeça no meu travesseiro, Luna
dormiu.
E dormimos todos sem interrupção? Acho
que não...
Lá pelas tantas – vai saber a hora... –
acordo com um “Mamããããe! Mamããããe!”, com uma voz animada como se fosse quatro
da tarde. Quando meu consciente voltou das profundezes do mar, percebi que o
mundo caía lá fora. O barulho da chuva era similar ao de uma cachoeira que
estivesse na cabeceira da cama. Assim que percebeu meus movimentos, Luna
começou: “Alulho! (barulho) Alulho! Tatai (papai) banho onete (sabonete)”. Sem
perceber que o pai estava deitado ao seu lado, Luna relacionou o barulho da fúria
de Poseidon ao do chuveiro e repetiu mais algumas vezes: “Alulho! Tatai banho
onete”.
Achei aquela conversa tão engraçada e a
linha de raciocínio tão interessante pra uma criança tão pequena... Mas eu não
queria deixar Luna com “informações erradas”. Disse que o papai não estava
tomando banho, que ele estava deitado ao seu lado. Ela olhou pra ele e passou a
mão em seu rosto. Eu expliquei que aquele barulho era de chuva. “Uta?” “Sim,
filha, chuva, lá fora.”
Ela parou, me olhou e a minha credibilidade
durou cinco segundos: “Alulho! Tatai banho onete.” Entreguei os pontos. Os
segundos depois foram de convencimento pra que ela voltasse a dormir. Beijei
sua bochecha e virei de lado. Acho que a explicação funcionou, ou foi o barulho
da chuva que a adormeceu de novo.