(Escrito em 06.11.2013)
Um
historiador me contou uma vez que a Catedral da Sé, localizada no centro da
cidade de São Paulo, é considerada um dos cinco maiores templos neogóticos do mundo.
Mas o que mais chamou minha atenção durante o passeio foi a informação de que a
arquitetura desta “casa de Deus” foi desenvolvida com a intenção de pressionar
o ser humano, ao adentrar pelo portal principal, a se sentir diminuído perante
a grandiosidade divina e da própria religião Católica. Funcionou pra mim, pelo
menos enquanto estava dentro da igreja.
Esta mesma
sensação voltaria apenas anos depois, quando decidi circular, por um período
mais extenso do que uma visita de uma hora, por uma instituição religiosa com
um caráter um tanto diferente. Quando me dei conta, estava ali, de pé, no meio
do pátio de uma das maiores universidades do país; e o fato dela ser
fundamentada no catolicismo talvez fosse mera coincidência. Eu sabia que tinha
feito a opção consciente de estar ali, mas nunca imaginaria que a sensação de
estranhamento seria aflorada daquela maneira.
Cada
passo no chão de pedras, cada olhar ao redor remetia a uma lembrança
nostálgica, no campus de outra universidade. Mas aquela menina de anos atrás,
com toda sua imaturidade, tinha uma incrível sensação inconsciente de
pertencimento com o local que frequentava diariamente. Já esta mulher de agora
via os prédios daquele pátio maiores do que eram e sentia uma pressão vinda de
cima, a céu aberto. Não era necessariamente ruim, mas aquele mundo não fazia
mais parte de mim há tanto tempo que eu sentia como se todos me olhassem,
perguntando ‘O que ela faz aqui?’.
Desta vez
a escolha não foi tão simples quanto pegar o metrô e descer no marco histórico
de São Paulo. Foram meses e meses de conflitos internos, divagações sobre o
presente e, principalmente, sobre o futuro. Muita pesquisa, muita conversa. A
decisão de voltar a frequentar um centro universitário não se faz de um dia
para o outro, ainda mais nas minhas condições atuais.
Estava
tudo tão confuso que, por outro lado, eu sentia um orgulho imenso de caminhar
entre aquela multidão de adolescentes e jovens, carregando uma bolsa preta,
grande, com a foto da minha filha bordada na lateral. Pra mim, aquela foto
representava toda uma história pessoal e aquele sorriso de criança me dava
coragem pra continuar a caminhada; ela era a minha religião.
Não seria
possível mover montanhas, mas pensar na minha filha me fez abraçar a mudança e
acreditar que aquela nova fase aumentaria meu amor-próprio e a confiança na
minha capacidade de ir além, e assim eu poderia estar com ela de uma maneira
mais inteira, mais completa. Avançar nos estudos me fazia acreditar que ver o
mundo com outras formas e outras cores, conhecer pessoas com objetivos um tanto
em comum, mas com visões de mundo tão diferentes, enriquece a gente. Uma
pós-graduação não é apenas uma linha a mais no currículo, pode ser a
oportunidade de mudança de rumo na vida.
Os
desafios são muitos, mesmo! E neste momento da minha jornada individual
percebo, mais uma vez, que aqueles conselhos engessados não parecem fazer o
menor sentido. “Não chegar atrasada na aula”, quando se trabalha em horário
comercial. “Arranjar um local para estudar”, sendo que o escritório de casa
fica, literalmente, a dois passos da sala de estar, do tapete onde a cria
brinca com a cadela da família. “Aproveitar o tempo ao máximo”... Acho que da
meia-noite as seis seria um bom período para estudar, depois de matar a saudade
do marido, da filha, banho na menina, pijama, mamadeira, história pra dormir,
mala da escola, uniforme do dia seguinte... “Fazer com que seus filhos lhe
ajudem”?! O que eu poderia pedir para uma criança de três anos que pudesse me
fazer ganhar cinco minutos de tempo extra? Deixemos a escravidão ajuda
com as tarefas domésticas para o futuro.
Se por um
lado nem tudo são flores, por outro tenho um jardim inteiro à minha disposição;
rosas, margaridas, girassóis, begônias, gérberas, tulipas copos-de-leite,
lírios, orquídeas. Se nunca precisei faltar, é porque posso contar com pessoas
que se dobram ao meio para ficarem com minha pequena nos dias das aulas; pais,
marido e sogra; desmarcam compromissos e rodam a cidade pra que eu possa estar por
inteiro na sala 27. O meu jeitinho questionador, protestante e sistemático foi
bem recebido por colegas - e amigos - de sala que iniciaram a caminhada antes
de mim; isto faz meus sacrifícios ganharem mais sentido e possibilita que eu
seja eu mesma na busca dos meus objetivos.
Despesas a
mais, cronogramas apertados, estresses que não existiam e novas metas a
alcançar. Menos tempo para ficar com a
família, redução das horas de sono e mudança de ritmo. Conhecer pessoas com
experiências pessoais e profissionais incríveis, seguir o coração, buscar ser
feliz no trabalho e acreditar que tudo é um investimento para um futuro próximo
- o amanhã.