Querida Luna,
Você ainda não sabe, mas quando sua mãe
nasceu, eu vim com “defeito de fábrica”; mas durante alguns anos, nada seria
percebido. Quando adolescente, ela descobriu que tinha arritmia – um distúrbio
no ritmo em que eu batia. Nada grave, sem causas aparentes: ela não fumava, não
ingeria álcool, cafeína, muito menos cocaína, e não tinha o menor sinal de estresse.
Descobriu, porque comecei a bater acelerado e com tal intensidade que, quando
um copo com água era colocado sobre seu peito, a água balançava e espirrava pra
fora do copo. Passou alguns anos controlando com medicamento, até que resolveu
parar por conta própria, pois os sintomas haviam desaparecido.
O que ela não sabia, era que, anos
depois, me faria trabalhar e bater descompensado e fora do ritmo para o resto
da vida. As alterações começaram na gravidez, quando ela passou a prestar mais
atenção em mim, e percebeu que eu bombeava com mais intensidade, pra te
atender. Só ficou mais tranquila quando fez os exames e concluiu que, além da
maior necessidade de circulação sanguínea, estar tão perto de você me deixava extremamente
animado! Se sua mãe soubesse que ter você faria com que eu batesse tão apertado,
acelerado, preocupado, histérico, emocionado, orgulhoso, entristecido, divertido,
e transbordante de amor até meu último pulsar, ela acharia aquela arritmia da
adolescência coisa de amador.
Os olhos de sua mãe são os meus olhos;
seus ouvidos, os meus. E, há exatos três anos, cada vez que você aparece no
campo de visão, ou que o timbre de sua voz chega até mim, aquela constância rítmica
muda, desequilibra e perde o foco da contagem. A cada ano que passa eu encontro
novas formas de bater, tudo é sempre novo pra nós. Sou um órgão muscular oco,
envolto por um saco cheio de líquido chamado pericárdio, localizado no interior
da cavidade torácica; e você vai continuar sendo o motivo pelo qual pulso,
todos os dias. Obrigada por cada pulsar.
Assinado:
Coração de mãe
Nenhum comentário:
Postar um comentário